*Por Movimento das Comunidades Populares (MCP) | Texto publicado originalmente no Jornal Voz das Comunidades, Ano 15, nº 39 (março de 2021) | Foto: ocupação MCL em Goiana (PE)
1- Como entendemos a estratégia do MCP para o campo? 2- Em quantas áreas rurais o MCP atua em nosso município ou região? 3- Como avaliamos, a partir do PNLA, a construção das Comunidades Populares no campo? 4- O que é preciso melhorar?
Em 1983, o MER (Movimento de Evangelização Rural) realizou um Encontro Nacional. O evento aconteceu no Centro Diocesano do Papagaio, em Feira de Santana (BA). O objetivo era discutir a Reforma Agrária a partir da experiência de luta de resistência na terra, que, desde 1969, o MER vinha conduzindo nos estados de Alagoas, Bahia, Maranhão, Paraíba e Pernambuco. A direção do Encontro foi de um grupo de camponeses e operários.
Como o MER era uma organização discreta, as conclusões não foram divulgadas, mas foram devolvidas para as suas bases. A principal conclusão do Encontro foi de que a Reforma Agrária só daria certo se fosse junto com o Socialismo. Reforma Agrária junto com o Capitalismo só deu certo na Europa, EUA e Japão. Porém, esses países eram imperialistas e não permitiam que a Reforma Agrária se realizasse no Terceiro Mundo. Isso para evitar o desenvolvimento de outros países capitalistas que se tornariam seus concorrentes.
As experiências de Reforma Agrária em países do terceiro do Mundo, como Peru, Chile, México e outros, não foram para frente. As Reformas Agrárias que realmente deram certo aconteceram em países que fizeram mudanças socialistas.
No Brasil, a Reforma Agrária só daria certo se fosse feita por um Governo Socialista Revolucionário, com base na aliança operária e camponesa. Portanto, a nossa tática deveria ser a luta pela terra ligada a uma estratégia de luta pelo Socialismo.
A partir daquele Encontro do MER, ampliamos nossa luta pela terra, principalmente com os posseiros, para não serem expulsos de suas áreas de trabalho e moradia. Ampliamos também a nossa atuação junto à classe operária e aos assalariados rurais para fortalecer a aliança operária e camponesa. Muitos militantes do MER, inclusive camponeses, se transferiram para áreas de assalariados rurais e outros para as fábricas.
Durante o Governo Sarney, “Nova República”, (1985-1989), o MER se transformou em CTI (Corrente dos Trabalhadores Independentes). Através da estrutura sindical, ampliou sua luta no campo. Além da defesa da terra para os posseiros, passamos a fazer lutas por políticas agrícolas para os pequenos proprietários rurais. Com isso, ampliamos nossa atuação no campo em São Paulo, Rio Grande do Sul e outros Estados.
CPT – MST – Ocupações de Terra
A partir de 1975, a Igreja Católica criou a Comissão Pastoral da Terra para apoiar a luta dos trabalhadores rurais. No Nordeste, a CPT demorou mais para se implantar, devido à presença forte do MER, que atuava através da Pastoral Rural.
Em 1984, surge o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). Começa no sul do país, por influência da CPT da região. Inicialmente, houve certa resistência no Nordeste, devido à tradição de luta que essa região teve no passado: Canudos, Caldeirão, Ligas Camponesas, Encontro de Irmãos, CENTRU e STR. Tinha outra cultura, diferente do Sul.
O MST inaugura uma nova forma de luta pela Reforma Agrária: os Acampamentos e Ocupações de terra.
Na década de 1990, com o Neoliberalismo, o MST cresce. O próprio sistema facilita as ocupações. Era preciso modernizar o campo. O latifúndio se tornava Agronegócio ou era expropriado para fins de Reforma Agrária. O MST teve a capacidade de aproveitar dessa conjuntura
para crescer.
Porém, o MST tinha um problema de origem: nasceu atrelado ao PT. Mesmo quando esse partido mudou a estratégia para a Social-Democracia, através da conciliação de classes, o MST continuou atrelado a ele.
Quando Lula foi eleito Presidente da República, em 2002, a esperança de se fazer a Reforma Agrária era muito grande. A surpresa foi que o governo Lula desapropriou menos terra do que o governo neoliberal de FHC. Ele deu continuidade à política de modernidade no campo, apoiando a Agricultura Familiar como braço auxiliar do Agronegócio.
MCL também passa a fazer Ocupações
Nós, da CTI, na década de 1990, nos transformamos em MCL (Movimento das Comissões de Luta), com prioridade aos mais sofridos (pobres). A maioria dos militantes saiu das entidades sindicais e associações e passou a atuar nas Comissões de Luta, no campo e nas periferias das cidades. Nas cidades, ampliamos a luta por moradia, inclusive com ocupações. No campo, organizamos várias ocupações em Pernambuco, Paraíba, Bahia e Maranhão.
A partir do ano 2000, começamos uma nova estratégia em nosso Movimento. A prioridade passou a ser a construção de Comunidades
Populares no campo e na cidade. Organizar as dez Colunas, a partir das dez principais necessidades do povo. Iniciamos o século XXI com
esse desafio: Como transformar os assentamentos e outras áreas de pequenos proprietários rurais em Comunidades Populares com
dez Colunas?
Fundação do MCP e o PNLA
Em 2011, quando fundamos o MCP, já tínhamos acumulado dezenas de anos de experiência e reflexão sobre a Reforma Agrária. Definimos
como estratégia a construção da Reforma Agrária Comunitária, baseada nas experiências históricas como Canudos (BA), Caldeirão (CE), Tromba e Formoso (GO), entre outras.
Isso significa que a terra deve ser comunitária (como os territórios indígenas e quilombolas). Mas, a produção e a comercialização também
devem ser coletivas. Assim como a escola, a saúde, a religião, o esporte, o lazer, etc.
Nas áreas das pequenas propriedades rurais (Agricultura Familiar), a estratégia é organizar as famílias em Associações, para facilitar a aquisição de insumos para a agricultura e a venda dos seus produtos. Incentivar a organização de Feiras Comunitárias, para
comercializar a produção familiar. Incentivar a Agroecologia, tendo a região de Alagoa Nova (PB) – Polo da Borborema – como referência.
O PDS (Projeto de Desenvolvimento Sustentável), implementado em Anapu (PA), também era um exemplo para nós. Mas, Coroatá (MA) sempre foi nossa experiência mais significativa no campo.
O futuro do povo brasileiro está no Campo
Considerando as dimensões do nosso país e suas riquezas naturais, é uma contradição a maioria do povo viver nas grandes cidades. A vida urbana virou um caos. Moradias sem espaço para abrigar toda a família. Bairros, vilas e favelas sem saneamento e espaço público. Crianças e idosos vivendo em meio a um barulho infernal. Trânsito congestionado. Ar poluído. Ruas superlotadas. Alagamentos e deslizamentos provocando tragédias todos os anos. Violência, drogas e prostituição. Grande número de pessoas morando na rua. A única solução é voltar ao campo.
Para isso, é necessário transformar os povoados rurais e pequenas cidades do interior em Comunidades Populares, onde a própria população possa controlar seu território. Levar para o campo tudo de bom que tem na cidade, mas não permitir que as mazelas do capitalismo se estabeleçam nas comunidades rurais.
A luta em defesa do meio ambiente é fundamental para a volta ao campo. Se não lutarmos, o capitalismo vai levar para o interior o mesmo
caos que criou nas cidades. É preciso resistir, defendendo a cultura camponesa e lutando por terra, água e alimento. Unindo camponeses, indígenas, quilombolas e trabalhadores urbanos.
O MCP teve a sua origem no campo. Continua atuando em dezenas de áreas rurais. A partir da experiência que temos e de outras que conhecemos, devemos ir construindo Comunidades Populares que possam servir de exemplo para, no futuro, a população da cidade voltar ao campo. Só fica na cidade quem é necessário ficar ou quer permanecer por outras razões.
Documentos como “O dossie Belo Monte – Nao ha condicoes para a licenca de operacao”, organizado pelo Instituto Socioambiental (ISA) e publicado em junho de 2015 (que denuncia os riscos para as populacoes indigenas ribeirinhas com o inicio do enchimento dos reservatorios da usina hidreletrica de Belo Monte, situada na regiao de Altamira, PA e com o desvio definitivo do rio Xingu para que parte da usina comece a operar) e o relatorio “Violencia contra os povos indigenas no Brasil – dados de 2015”, elaborado pelo Conselho Indigenista Missionario, sao reveladores das condicoes aviltantes impostas aos povos indigenas brasileiros. Embora reconhecamos a impossibilidade da norma, de a lei transformar a vida concreta, por reconhecer os limites da igualdade formal, e da funcao social do sistema juridico na sociedade capitalista, e importante destacar o avanco normativo que trata dos direitos dos povos indigenas no Brasil. A aceitacao social de que as terras indigenas sao “direitos originarios”, ou seja, antecedem a criacao do proprio Estado brasileiro, e fundamental para os processos de demarcacao, considerando as pressoes constantes do grande capital atraves do agronegocio que amplia os processos de expropriacao dos povos indigenas de suas terras.