Carta de Apresentação
O Grupo Agroecológico Araucária Resiste é uma experiência coletiva com atuação na região Alto Uruguai do Rio Grande do Sul. Nascida agora no início de 2022 reunindo trabalhadores/ras da roça que praticam e difundem a agroecologia, resultado também de um modesto acúmulo desenvolvido nos anos anteriores por uma outra experiência; o Mutirão-Grupo de Trabalhadores da Terra, que fez um trabalho inicial pra mobilizar alguns debates e propor algumas práticas aqui pela região, sendo aquela uma pequena experiência, uma semente germinada que agora passa a se enraizar e precisa de outros cuidados neste novo ciclo para que possamos dar vida para a luta autônoma pela agroecologia e contra o ecocídio a partir de nossa região.
O Mutirão, na sua breve caminhada de dois verões, ajudou a tecer a articulação da Teia dos Povos em Luta no RS e agora o Grupo Agroecológico Araucária Resiste vem pra seguir esse trabalho de mobilizar comunidades campesinas, tentando aportar na aliança maior dos povos do campo, das águas e das florestas que libertará a terra defendendo a vida.
Inspirados pela resistência camponesa, pela luta indígena, pela luta do povo preto e pelo exemplo revolucionário de outros lugares como as coletividades agrárias na Revolução Espanhola e comunalismo agrário da Revolução Mexicana nós estamos em marcha, com passos humildes mas em movimento.
Organizativamente nos baseamos em principios de autogestão e democracia direta como forma de possibilitar a participação de todas e todos, diminuindo ao máximo possibilidades de centralismo e relações de mando e obediência. Delegando tarefas quando necessario mas com mandados controlados pela coletividade.
Também defendemos a autonomia da coletividade frente ao estado, partidos políticos, igrejas e empresas. Acreditamos que o caminho somente nós mesmos poderemos construir e rejeitamos firmemente qualquer tipo de intervenção vinda desse tipo de agente que geralmente só reforça as lógicas perversas do agronegócio, da terra como propriedade e não como mãe geradora da vida.
A formação social de nossa região exige que o Grupo Araucária Resiste trabalhe com firmes propósitos antirracistas, debate muitas vezes deixado de lado na esquerda local e que trouxe prejuizos incontáveis as lutas pela terra no Sul do Brasil. Abraçar a luta dos povos indígenas e do povo preto passa a ser questão incontornável pra que superemos de uma vez por todas a desigualdade e a miséria que racismo e colonialismo impuseram por aqui.
O combate as opressões de gênero e a luta das mulheres também para nossa coletividade é algo primordial, necessário fortalecer a luta das companheiras dentro e fora de nosso coletivo. Historicamente as mulheres tem sido a força politica motriz das lutas por terra, devemos aportar tudo na luta que libertará corpos e territórios. Combatendo o machismo e o patriarcado diariamente, do topo à base da pirâmide.
Como fundamento a nossa caminhada parte da Agroecologia que é um modo de viver, é resistência, a re-existência no campo. Pela agroecologia estamos em retomada do conhecimento dos ciclos naturais os quais estão se perdendo ano a ano. A agroecologia vem ao encontro dos princípios naturais, buscando melhor aproveitamento do ambiente com a diversidade de espécies as harmonizando ao sistema analisando a função de cada planta num sistema vivo e abundante. Também seguindo os princípios da equidade e aumentando a autoestima das pessoas do campo, respeitando a diversidade por completo, uma filosofia e prática de vida. Que nós posamos ser como os agregados no solo que através da coletividade, cooperação possamos somar no ambiente, fortalecer as raízes, nutrir os cernes. Reintegrando camponeses com a terra pois a agroecologia vai muito além do que uma forma de produção de alimentos saudáveis, corresponde a uma nova perspectiva social no campo, se desvinculando dessa dependência de receituários de técnicos, pois não são os detentores dos saberes, a agroecologia se nutre não somente dos saberes acadêmicos mas principalmente de saberes populares e tradicionais dos agricultores/as, revivendo esses conhecimentos campesinos, combatendo essa amnesia biocultural estabelecida pelo sistema do agronegócio. Através da agroecologia trabalhadores/as deixam de ser vistos como meras peças, objetos, e passam a ser sujeitos que criam suas próprias existências, rebrotando, depois de envenenados pelo sistema excludente e insustentável capitalista, com os conhecimentos ancestrais, campesinos reassumindo o direito de existir e coexistir no território. A produção em sistemas agroecológicos visa a produção de alimentos ecologicamente sustentáveis, economicamente viáveis e socialmente justos, integrando ser humano com o ambiente, possibilitando diversidade de plantas em consórcios, gerando sua subsistência e segurança alimentar, promovendo a geração de renda pela comercialização do excedente.
O sistema de produção do dito “convencional” está fadado a depender das multinacionais do agronegócio, pois a cada ano o uso dos insumos químicos só aumenta, o solo passou a ser praticamente só um suporte inerte para as raízes, pela escassez da biota do solo, a vida nele já está esvaída. Lutamos diariamente contra isso, nossa terra vem sendo envenenada, nossa água contaminada, nossas sangas assoreadas, tudo isso devido ao manejo insustentável do monocultuvo de pensamentos vindo desse sistema de produção da morte.
Lutamos pela autonomia pela construção de Territórios, lutamos pela Terra, pela Vida, contra o aumento da desigualdade, a insegurança alimentar, lutamos por vida digna para todas e todos. Por autonomia, segurança e diversidade alimentar resgatando saberes dos antigos camponeses e povos originários que os conhecimentos dos antepassados sejam semeados e cultivados como a resistência que somos, os saberes populares estão entremeados como um cipó em uma araucária de conhecimento uma conexão enraizada profundamente entre os seres e a natureza na qual constrói nossa essência. Essa resistência está em pequenos espaços pela mata afora, mas unindo e tecendo essas conexões nos fortalecemos.
Para nós o único sistema bancário que nos interessa dialogar é o de bancos de sementes crioulas que estão surgindo como forma de luta contra a transgenia, como esse controle de onde uma empresa transnacional por modificar o código genético se determina como “dono” de uma variedade, sendo que povos originários estão domesticando a milênios por seleção massal. A história de resistência por trás das sementes crioulas nos incentiva a multiplica-las e espalha-las.
Nos situamos no ecossistema da Mata Atlântica, floresta ombrófila mista, a floresta de araucária, um ambiente úmido, com uma das maiores diversidade de plantas do mundo, e que reduzida a menos de 5% do que já foi reiniciaremos das pequenas faixas lutando contra o dominio do monocultivo. Emergimos com o ideal de reerguer as florestas de araucárias! Juntos com o sistema agroflorestal visamos reflorestar as espécies nativas que aqui antes da colonização eram abundantes, retornarmos e nos adaptar uma proposta ao ambiente em que estamos. Vamos juntos semear e cultivar experiencias agroecológicas na região Sul, pouco a pouco retomando os conhecimentos antigos, anticoloniais e revolucionários.
Agroecologia ou Morte!