*Por Andressa Zumpano/Articulação das Pastorais do Campo
Hoje, 28 de abril de 2021, entra em pauta no senado federal a votação para aprovação do PL 510/2021 de autoria do Senador Irajá Abreu (PSD-TO). O projeto tem como proposta a alteração de leis que versam sobre a regularização fundiária no Brasil, desburocratizando, flexibilizando e favorecendo a expansão dos latifúndios em terras públicas, possivelmente adquiridos a partir da grilagem.
A votação retornou para a pauta em meio à grande mobilização da sociedade civil pressionando o poder legislativo para o avanço das políticas de saúde e ampliação da vacinação diante da pandemia de COVID 19 no país, que já contabiliza mais de 400 mil mortes. Na atual conjuntura, em que um genocídio marca os anos de 2020 e 2021, impactando fortemente territórios indígenas, tradicionais e camponeses pela pandemia, bem como acentuando a insegurança alimentar e a fome, a votação dessa pauta não é emergencial e traz como consequência o aumento de impactos ambientais e conflitos fundiários no país.
O senador Irajá Abreu (PSD-TO), que propôs o projeto, é filho da senadora Kátia Abreu, conhecida aliada dos ruralistas no Brasil, responsável por grandes projetos de favorecimento e crescimento do agronegócio. O projeto retoma os mesmos termos da MP 910/2019 , numa redação ainda pior, MP da qual Irajá foi relator. Conhecida como MP da Grilagem, teve sua votação suspensa em 2020, após grande pressão de movimentos sociais e ativistas, que destacavam a não prioridade dessa pauta diante da pandemia, além de favorecer a já iminente destruição dos biomas brasileiros pela expansão do agronegócio, da mineração e do desmatamento.
Outros pontos de destaque na proposta, puxada pela Frente Parlamentar Agropecuária, são: unificação da legislação de Regularização Fundiária para todo o país, e não apenas na Amazônia. Inclui permissão da utilização da terra como garantia para empréstimos relacionados à atividade a que se destina; possibilita a renegociação dos títulos antigos firmados até o dia 10 de dezembro de 2019; coloca o imóvel como garantia do pagamento do Título, em substituição à cláusula resolutiva; determina a obrigatoriedade do Cadastro Ambiental Rural (CAR) nos processos de regularização.
Segundo Erina Gomes, assessora jurídica do Conselho Pastoral dos Pescadores “O PL 510/2021 apresenta novamente alteração do marco temporal – a atual legislação permite titular terras públicas da União ocupadas até 2011, mas o PL amplia para 2019 a data limite de ocupação de terra pública que pode ser titulada sem licitação. Propõe alterações que beneficiam médios e grandes posseiros e especuladores de terras públicas, permitindo a regularização fundiária por quem já é proprietário de outro imóvel rural, bem como de quem já tenha sido beneficiário de programa de reforma agrária ou regularização fundiária e, permite que o beneficiário que transferiu ou negociou o título obtido possa ser novamente beneficiado por programas de reforma agrária ou regularização fundiária.”
O que acontece caso o PL 510/2021 seja aprovado?
O PL atua como um “verdadeiro prêmio para grileiros de terras públicas, ou seja, para aqueles que invadem e desmatam ilegalmente terras públicas da União, com a expectativa futura de conseguir a titulação a preços muito abaixo do mercado, e vendê-las…a mensagem que o PL passa é que invadir terra pública compensa”, reforça Erina.
A cientista política Mayrá Lima ressalta que “partindo do Senado Federal, se aprovado, o PL segue para a Câmara dos Deputados em um cenário bastante desfavorável para oposição, visto que a Frente Parlamentar A é melhor organizada entre os deputados. A pressão da opinião pública ainda pode ser fator de influência, mas lembrando que o atual presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas) foi eleito com forte apoio dos ruralistas. A conjuntura é mais desfavorável.”
De acordo com levantamento da Comissão Pastoral da Terra, o ano de 2020 ficou marcado pelo aumento das invasões de territórios tradicionais. Caso o projeto seja aprovado, esses dados tendem a crescer ainda mais, ameaçando os povos tradicionais e indígenas, que já se encontram em situação de grave vulnerabilidade socioambiental durante a pandemia.
Outros crimes socioambientais gravíssimos marcaram os dois primeiros anos de governo Bolsonaro, como as grandes queimadas que atingiram os biomas cerrado, amazônia e pantanal, avanço da mineração em territórios indígenas e altos índices de desmatamento em áreas de proteção ambiental.
O PL 510/2021 não traz nenhuma contribuição para a redução da grilagem de terras ou dos crimes ambientais produzidos pela agropecuária e agroindústria. Pelo contrário, pode avançar com a invasão de terras públicas aliadas ao desmatamento. Essa é a resposta que o Governo Federal e o poder legislativo dão aos territórios vulnerabilizados pela pandemia e capitalismo no país.
“Não é uma legislação que atende ao pequeno camponês, até porque a legislação atual já os atende. Trata-se de um PL para resolver os problemas de quem ocupa irregularmente grandes áreas públicas. Sem dúvidas, o sentimento de impunidade em relação à legislação ambiental e o bloqueio da democratização da terra ganham força com esse projeto”, destaca Mayrá.
Movimentos sociais pressionam mais uma vez pelo cancelamento da votação e consequentemente da proposição do projeto de lei, para que se priorize os investimentos em saúde para contenção da pandemia de coronavírus no Brasil, pelo retorno do auxílio emergencial de R$ 600,00 e pelo impeachment imediato de Jair Bolsonaro, principal responsável pelo genocídio em curso no país.