No dia 12 de Março, Neto Onirê Sankara da Direção Estadual do MST Bahia, e conselheiro da Teia dos Povos, visitou Mestre Joelson Ferreira no Assentamento Terra Vista/BA em busca das sementes de milho crioulo para a terra da Brigada Ojeffersson e do Quilombo Terra Livre. A partilha de sementes é o primeiro passo para ruptura com a chantagem da fome em que estamos sendo subjugados. É depois dele somos capazes de construir a autonomia alimentar da terra e do território.
Foi assim que os escravizados quilombolas do Brasil que organizaram o reino negro dos Palmares no Nordeste brasileiro conseguiram resistir durante todo século XVII. Foi assim que os povos originários no México adquiriram uma prodigiosa capacidade de organização de uma população gigantesca. Foi assim que os povos originários no Brasil sobreviveram a dezenas de expedições militares enviadas por holandeses, franceses e portugueses. Na Teia dos Povos, a autonomia alimentar serve para unificar as lutas de forma participativa com o objetivo de garantir a autossustentabilidade das comunidades.
O milho crioulo é a síntese e o princípio desse processo. Através da sabedoria de todos esses povos, a Teia busca recuperar o poder de cultivo com base nas nossas experiências com a rede de sementes, essencial para a produção da nossa existência e resistência contra a hegemonia do capital. A rede é um processo revolucionário cuja serventia vai para além da alimentação dos povos: faz parte da comunicação, da preservação e do embate direto contra a cultura alimentícia exploradora, artificial e tóxica do mercado. E a revolução avança.
O companheiro Neto depois de tomar conhecimento da semente crioula no Assentamento Terra Vista no ano de 2020, voltou esse ano com o intuito de dobrar a quantidade que tem distribuída entre os moradores do seu território e lá construir um espaço para preservar as variedades nativas de sementes e continuar transmitindo o conhecimento tradicional da agricultura que é essa relação sagrada do ser humano com a terra. “Foi um processo de cuidado, proteção para não perder e para semente ficar produtiva ainda pra ser plantada agora” disse o conselheiro da Teia dos Povos.
Milênios antes que os europeus descobrissem a América, os povos que a habitavam já praticavam algum tipo de agricultura: “Este milho se planta por entre as canas novas de açúcar. E colhe-se a novidade aos três meses, uma em agosto e outra em janeiro” escreveu Gabriel Soares de Souza nos anos de 1500 no Brasil. Deserdados dos grandes plantios, o povo negro dependia, além da brilhante estratégia militar, de um diverso conhecimento cultural de produção da agricultura para manter a liberdade dos seus e a sobrevivência do quilombo. Há doze anos as sementes de milho crioulo viajaram do Assentamento Terra Vista e, no contexto da Covid-19, seu caminho se mostrou entre os territórios garantindo comida na mesa, ou seja, sustança e fartura.
Na série Caminhos das Sementes feita em 2020, mostramos como as sementes de milho crioulo foram fundamentais na conquista da soberania alimentar, e, sobretudo, da autonomia dos povos. Entramos no ano de 2021 e o povo garante o milho do São João e fortalece a luta por terra e território que permeia nossa história há mais de 500 anos.
Confira os artigos da série Caminhos das Sementes