Posted on: 29 de março de 2021 Posted by: arkx Brasil Comments: 0

Em cada história se entrelaçam muitas histórias. As inúmeras histórias que compõe a longa e árdua história de nossa jornada.
Em cada vida há várias caminhadas. Conhecê-las é compreender melhor o nosso movimento e também a nós mesmos.
Aqui apresentamos um pouco da história das caminhadas de Nildo Sacramento, do Quilombo pesqueiro de Graciosa, Taperoá (BA), companheiro da luta para destruir o capitalismo, o racismo e o patriarcado.

O Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP)

Eu tinha nem uma noção de movimento social. Só que já fazia luta. Porém aquela luta sem surtir efeito, porque a gente não era organizado.

Sempre fui um defensor do meio ambiente, sempre lutei pelo direito da terra, mas de forma isolada, porque não tinha essa consciência de movimento.

E aí, em uma formação, que me convidaram há um tempo, passei a ter essa consciência do que é movimento. Consegui me sentir amparado. Digamos assim: – Não! Não estou só!

Conheci o MPP e passei a participar. E não era nada diferente do que eu já fazia na comunidade. Lutar em lutar pelos direitos, lutar pelo direito à terra, à água.

Lutar pelos que estão por vir. Ter a consciência do que faz a gente estar aqui é justamente as pessoas mais velhas.

Por fim ter consciência também de que existia dois lados, que até aí a gente não sabia. Eu, por exemplo, não tinha essa expertise ainda de saber qual é o lado do povo, qual é o lado da elite.

A gente é explorado a vida toda. E gritava de um lado, gritava de outro e a gente nunca era ouvido.

E a partir de me integrar no movimento, foi que eu passei também a perceber que só o movimento é que pode fazer um mundo mais igual.

Aí eu entrei de cabeça, E estou aí!

Tudo o que aprendi, tudo que venho aprendendo, é através do movimento. É através da liderança, dos mais velhos. Eu vim em luta, sigo em luta.

A luta do MPP é em defesa da terra e da água. Que comunidade pesqueira vai viver sem a água e sem a terra?

Desde 2015 eu já lutava aqui na comunidade. Tinha empresário tentando tomar a comunidade. Mas uma luta muito sem sucesso. E a partir do movimento a gente começou ter um resultado positivo.

Abaixo de Deus o movimento é tudo prá mim. Porque é onde a gente conhece gente igual a gente.

Cheguei a pensar por algum tempo que todo mundo era, era… digamos gente em quem não poderia confiar, né? Ou achar que todo mundo tava ali só prá defender o seu. E aí batia aquele desânimo, aquela tristeza.

Mas com o movimento passei entender que só faz sentido a gente estar aqui, se a gente fizer algo parecido, pelo menos, com o que os nossos antepassados fizeram para que a gente hoje esteja aqui.

Então foi a partir dessa consciência que eu achei que era o meu espaço, que eu deveria estar. Tinha que tá na luta, precisava aderir o movimento. E ser uma pessoa como eu sempre fui.

Mas de certa forma a gente era obrigado a cada um defender o seu. Que o sistema dessa forma faz prá gente se fragilizar.

Só em a gente saber que não está só, que tem gente aí nos quatro canto do mundo. Sempre tem alguém que está aí olhando por nós. Sabendo o que está acontecendo. Trocando experiência. Que a realidade na verdade é uma só, independente de estado.

A gente passa a perceber que nosso povo está aí. A gente precisa estar junto. É a única forma de a gente fazer diferente. Fazer com que a gente tenha um outro mundo. Um mundo diferente. Só assim a gente pode salvar nosso planeta.

Eu acho que só através do movimento. Independente de que movimento. Eu acho que quem vai salvar, e tenho essa esperança, quem vai salvar o planeta ainda é a luta dos movimentos.

A Luta pelo Quilombo da Graciosa

Sou da comunidade de Graciosa, uma comunidade quilombola, pesqueira, onde 95% da população, vive diretamente e indiretamente da pesca artesanal, da mariscagem.

Tinha uma cultura da plantação de arroz, de milho, de cana. Sou de uma família de pessoas que fazia rapadura, mel de cana. Plantavam arroz.

Mas com o tempo perdemos essas terra.

E quem sempre garantiu a sobrevivência dessas comunidades era a pesca, que há 25/30 anos atrás não tinha esse valor. Mas com o tempo o turismo avançou.

De 50 anos prá lá, nosso povo vivia nessas terra sem marcação. Todo mundo plantava onde queria, onde achava melhor. Poucas pessoas moravam nessa comunidade.

Com a chegada dos fazendeiro, fomos perdendo as terra. Fomos obrigado a migrar prá beira do mangue. E era a única alternativa de sobrevivência.

Na beira do mangue porque ali você tinha água, tinha peixe. Era uma área que os gananciosos ainda não viam como importante.

Mas com o avanço do turismo, de 35 anos prá cá, foi quando explodiu Morro de São Paulo, Boipeba, essas praias aí, e daí prá cá nunca tivemos paz. Porque Graciosa é uma comunidade que dá acesso a essas praias.

Quem escoava todo esse turismo era a Valença. Mas Valença superlotou. E de uns 10 anos prá cá, começaram os empresários a ver Graciosa como ponto principal pra escoar esse turismo. Para instalação de portos, estacionamento, posto de gasolina, coisas assim.

Tudo começou a ficar mais complicado prá comunidade.

Daí prá cá eu já estava me ligando ao movimento ao MPP. Percebi que eu tinha força. Eu percebi que a comunidade tinha força. Que a comunidade podia parar, podia interditar.

Eu viajava prá Salvador prá reunião e começava a levar essa discussão.

Com apoio do MPP conseguimos fazer uma retomada de uma área, justamente a área onde esses empresários tinha esse interesse em estacionamento, em posto de gasolina, em ampliação de portos, marina e um monte de coisa. Um projeto muito ganancioso mesmo, que iria gerar muito dinheiro.

Então como a gente era acostumado a denunciar, fazer tantas denúncias, denúncias e denúncias. E a coisa não surtia efeito…

Isso foi mais um aprendizado imenso prá mim que não tem preço que pague. É que a gente acreditava na justiça. A gente fazia uma denúncia, achava que aquilo ali ia dar um resultado.

Mas a gente passou a entender que essas denúncias simplesmente era só prá ir protelando, protelando… Enquanto a galera do capital avançava. E depois de instalado não tinha mais jeito.

Então foi isso que a gente fez. A gente resolveu fazer essa retomada.

Foi em 2014/2015. E aí a gente está aí na luta. Conseguimos interditar. Não 100% porque o porto  ainda é o local que escoa o turismo prás praias, prás ilhas. Mas pelo menos a gente conseguiu parar e interditar a construção que o grupo ia fazer.

Com a implantação desse projeto, desses empresários, com certeza iria expulsar muita gente da comunidade. E aumentar o tráfico, a droga, a prostituição.

Então a gente já tinha essa consciência . Não vinha nada de bom. Essa coisa de geração de emprego e renda é mito. É simplesmente prá enganar.

E que a justiça não ia fazer nada.

Então, a gente  retomou essa área. Temos um resultado bom da justiça, que garante a posse para a comunidade.

E foi a única forma da gente conseguir reivindicar nosso território.

A partir daí nós conseguimos trazer o INCRA, trazer a SPU, demarcar, ver a área. E demarcar todo o território quilombola.

Temos um território mais ou menos de 800ha. Uma comunidade onde tem 150 famílias, ou até mais um pouco que vem crescendo.

Com certeza daria prá todos viver em paz, plantar e criar, e ter muita abundância em alimentação. Porque somos um quilombo onde temos pesca e temos terra. Terra muito boa.

Porém, essas terra ainda continuam nas mãos dos fazendeiros. A gente tem terra, mas quintais pequeno. As terras mesmo, a maior quantidade está nas mãos desses fazendeiros ainda

A partir da chegada do presidente Bolsonaro tudo isso parou, e não conseguiu avançar mais. Que é justamente o objetivo desse governo, não deixar que a gente avance. E aí nós estamos aí no aguardo, de que a gente consiga mudar esse governo. E que venha um governo sensível à causa do povo trabalhador.

Prá mim, a presença do movimento, a participação no movimento, é magnífico. Porque somos de uma comunidade onde a gente só sabia obedecer. E hoje a gente diz o que quer. A gente senta prá trocar idéia, prá dialogar.

A gente ouve, mas a gente também exige ser ouvido. Nós levamos nossa sugestão, nós dizemos de que forma queremos viver, o que pensamos. Isso é liberdade.

A nossa luta conseguiu levar mensagem prá muitas outras comunidades da região. Então isso é muito positivo.

Claro que tem os pontos negativos. Como, por exemplo, agora na época da pandemia os empresários coseguiram dividir bastante as comunidades.

Mas a gente está aí, a gente está firme, sabemos o que queremos.


A comunidade de Graciosa está situada na divisa entre os municípios de Taperoá e Valença, às margens da rodovia BA-001 e na encosta do Rio Graciosa.
Os moradores da Graciosa vêm enfrentando nos últimos anos, especialmente a partir de 2007, uma série de conflitos em função do avanço de empreendimentos em seu território, relacionados (i) à expansão de equipamentos de infraestrutura voltados para o turismo e (ii) a atividades de aquicultura e maricultura intensiva.
Composta atualmente por 154 famílias, a comunidade ocupa tradicionalmente a área em questão e tem como atividades principais a pesca, a maricultura e o extrativismo.
Foi certificada em 2008 pela Fundação Cultural Palmares (FCP) como comunidade quilombola e, após a aproximação com o Movimento de Pescadores e Pescadoras (MPP), vem se organizando de modo a resistir e enfrentar os empreendimentos que se instalam irregularmente em seu território.
Em 08 de abril de 2015, os moradores retomaram a área em que estão instalados os galpões dos empreendimentos da Tinharé e da Aquicultura Grupo Graciosa e permanecem ocupando a área como uma forma de pressionar o INCRA a dar andamento à elaboração do Relatório Técnico de Identificação e Demarcação (iniciado apenas em agosto de 2015).

fonte: Mapa de Conflitos Envolvendo Injustiça Ambiental e Saúde no Brasil


O derramamento de petróleo

No final de setembro início de outubro o vazamento começou a chegar aqui na Bahia. Os órgãos responsáveis colocaram logo o alerta. Estava proibida a venda de pescado. Ficou um bom tempo sem ninguém querer comer peixe.

A gente pensava que era uma coisa que já ia passar logo. E a gente impactado, porque não podia vender. Ninguém comprava nosso pescado. E ninguém deu uma assistência prá gente.

O pescador, como todos sabem, só tem a pesca.

Meio mundo de pescador, de marisqueiros, as mulheres, principalmente, que trabalham na mariscagem expõe mais o seu corpo. Na água, na lama, no mangue. Com aquele risco de contaminação.

E todo mundo fazendo vista grossa, tentando só esconder.

E a única forma que o movimento teve prá uma pressão, prá que a gente pudesse ser visto e pudesse falar o que tava acontecendo, foi ocupar o IBAMA em Salvador.

Nós chamamos Marinha, chamamos o Ministério Público, vários órgãos prá gente passar a situação que nós pescadores estávamos passando. E os danos que esse petróleo ia causar no meio ambiente.

E foram empurrando, empurrando…

A Marinha nunca propôs nada. A gente dialogamos diretamente com a Marinha, a Marinha é um órgão responsável por essa questão. Mas a gente que é pescador tinha mais solução prá resolver o problema do que a Marinha.

Se não fosse nós da pesca artesanal cair prá dentro prá tentar recolher aquele petróleo…

De forma desorganizada logo no início. Iam chegando as comunidades, se juntavam e pegavam aquele negócio e colocando prá fora da praia, dos mangue.

Quando a Marinha só foi aparecer quando os pescadores já tinham recolhido todo aquele óleo. Só apareceu prá divulgar e falar que tinha pego. E mesmo assim ainda deixou aquele produto em locais que ele derretia com o Sol. Termina indo pra o mar novamente.

Eu sei que isso foi um dano imenso.

Na praia é mais fácil da gente recolher. Mas aquele petróleo que entrava no mangue não tinha como a gente recolher, porque ele é mais ou menos da cor da lama do mangue.

Falaram que íam reparar os pescadores pelo tempo que ficou sem poder pescar, sem produzir. Mas deram duas ou três parcelas. Na época era R$ 900 e poucos reais. E mesmo assim pra uma pequena parte.

A maioria dos pescadores não recebeu nada.

E nem teve satisfação nenhuma. Todo o empenho dos órgãos ambientais, e de outros lá, eles estavam ali só prá esconder de onde foi que saiu o petróleo. Como até hoje a gente não tem nada de concreto a dizer se petróleo veio de tal lugar.

E a gente ficou nesse prejuízo.

Aqui na região da Ilha de Tiaré, Boipeba, que fica aqui no Baixo Sul, foi constatado que o camarão e outros peixes estavam contaminado pelo petróleo. Mas isso foi feito pelo Bahia Pesca. E escondeu, não divulgou essa informação.

Foi chegando o verão, os empresários botando a maior pressão para que ninguém divulgasse.

Uma coisa absurda, meu irmão. Eu digo a você porque eu levei isso de conhecimento com os meus próprios olhos.

Os empresários se reuniam em Morro de São Paulo prá pagar as pessoas, prá gravar áudio, prá dizer que ali não chegou o petróleo, que ali estava tudo bem, que o turista podia vim e tal.

Eu presenciei os empresários botando jornalistas prá fora de Morro de São Paulo. Tudo isso com o conhecimento da Marinha.

E ninguém fez nada.

Então bateu aquela sensação tão ruim. Se a gente não tomar cuidado, a ganância vai destruir o planeta.

Os empresários pagavam prá ficar a noite toda monitorando, recolhendo aquele petróleo. Prá quando chegar no dia seguinte a praia não tá com nenhuma sujeira. Prá eles continuarem com o turismo

Foi assim que foi feito. Uma coisa horrível. E todo mundo acobertou.

Quem ficou no prejuízo fomos nós pescadores e o meio ambiente. Que até hoje a gente não sabe como está, qual danos foram causados. Porque ninguém vai divulgar. Ninguém nem divulgou, nem vai divulgar.

Aqui na comunidade de Graciosa, a gente teve que ocupar a Prefeitura prá nos atender com cesta básica. Prá fazer acompanhamento médico, de algumas pessoas que já tava aparecendo alguma reação na pele.

Mas graças a Deus ninguém morreu. Não sabemos se fica sequela ou não.

Eu presenciei quando o petróleo estava chegando na Ilha do Tanque, lá em Maraú. Eu estava indo prá Ilhéus. Aí um companheiro ligou pra mim, que o petróleo estava chegando lá.

E o IBAMA foi lá, pegou um pescador prá dizer que aquilo ali não era o petróleo não. Que era um outro óleo.

Isso foi feito a vida toda, tudo isso prá proteger os empresários.

Nós denunciamos em Salvador, denunciamos em Brasília, na Defensoria Pública, no MPF, e tudo. As pessoas ficaram no prejuízo. Não receberam nada até hoje.

Acabou meu irmão. Foi isso.

A pandemia e a terra

Eu pesco mas nunca quis trabalhar com atravessador. Sempre quis pegar meu produto, minha produção e levar até o consumidor final.

Então, o que eu fazia? Pescava, criava ostra, como eu crio ainda e pesco, e quando chegava a alta estação, feriadão, eu ia prá praia vender direto na praia.

Algumas pessoas já me encomendavam peixe. E a ostra eu vendia na praia, como ambulante mesmo.

A partir da pandemia eu fiquei com medo de ir prá praia. Comecei a ter consciência do perigo que era essa pandemia.

Como eu também sou do grupo de risco, eu me recolhi. Conversei com a mulher, com os filhos. E a gente achando que ia passar.

Chegou ao ponto que eu comecei a ficar doente, sem produzir, sem ganhar dinheiro.

Como eu sou uma pessoa que veio da terra, eu venho de uma tradição de trabalhar com a terra, conversei com uma mulher. E disse: “- Vou precisar botar uma rocinha aí.  Porque a minha cabeça não tá aguentando mais ficar aqui”.

Desde o dia 16/03/2020 eu parei de ir pra praia. Era da onde eu tirava meu sustento. Comecei a perceber com o tempo que a pandemia não ia passar só assim.

Comecei a me preocupar com a fome. Entendi que a fome vai  matar muita gente. Aí eu disse, vou plantar, eu vou plantar aipim, eu vou plantar o que comer.

E meti a cara na terra, botei uma rocinha. Plantei abóbora, plantando mais baseado naquilo que a gente come, naquilo que vai matar a fome.

Porque a preocupação maior não era só a minha fome, não era só a fome da minha família. Era a fome das pessoas.

Estava preocupado que muita gente estava vindo embora da cidade grande, voltando para as comunidade. E essas pessoas voltavam sem nada. Levaram tantos anos fora, mas quando voltaram, voltaram desamparados, sem um recurso.

Então, eu comecei ver aquilo e me assustei. Disse:

“- Rapaz, a gente tem que plantar. A gente tem que ter alimentação, porque a gente vai precisar ter comida prá dar às pessoas que vão chegar. E até aquelas que estão aqui vão precisar de um aipim, de uma batata, de uma coisa assim. A gente vai fazer isso.”

Da mesma forma que muita gente nos ajudou com cesta básica, com produto de higiene e limpeza, eu também entendia que a gente precisa fazer isso.

Conseguimos ajudar algumas comunidades com alimento da terra, da pesca. Porém o produto da pesca é um pouco mais caro, não tem como a gente doar, até porque nossa pesca é artesanal não consegue ter muita uma quantidade.

Já tem um aipim pra comer. Já colhi melancia. Já tem um abacaxi plantado. Já estou plantando milho, plantando quiabo. Estou plantando um monte de coisa. Comecei criar galinha também.

Já tem comida. Se eu não tenho dinheiro nenhum, fome eu não passo. E ainda tenho condição de dar comida a alguém.

E na intenção de inspirar outras pessoas. Porque a nossa intenção é essa. Fazer algo que a gente consiga contagiar outras pessoas.

Já fiz um mapeamento. A gente precisa de uma casa de farinha. Isso aí com o tempo a gente vai ver de que forma a gente vai conseguir.

Através dessa ideia de voltar a plantar, eu consegui a levantar que o sonho da comunidade é ter uma casa de farinha.

A pandemia fez isso. Eu busquei forma de me manter vivo e produzindo. Porque tanto na pesca como na roça eu consigo me isolar, eu consigo trabalhar.

A pandemia trouxe também uma questão que ficou assim muito vidente. Nós, nós povos de comunidades tradicionais, nós trabalhador, nós da luta, nós não significa nada prá essa galera aí que só pensa na riqueza e no dinheiro.

Quem está aí expandindo a pandemia, quem tá contaminando a pandemia são os ricos, são classe média alta.

Eu digo isso porque eu moro aqui, onde eu moro é a saída pras grandes praias. Morro de São Paulo e Boipeba, Itacaré. Não tem um feriado, num tem um fim de semana que o turista não desça. Eles tem dinheiro pra isso, Eles não deixam de vir. Ele não deixam de curtir.

As nossas comunidades estão sendo invadida por esse turismo miserável. Por essa galera que tem dinheiro, que eles não estão nem aí. Ele chegam nas comunidades, eles não tem respeito. Eles não botam uma máscara. A maioria deles. Eles não querem nem saber se vão contaminar a gente.

Morro de São Paulo nunca ficou vazio durante todo esse tempo de pandemia.

E aí a gente vê que na hora de ajudar as comunidade, a gente só pode contar com esse povo que é da luta mesmo, que é do movimento.

A gente não tem nenhuma assistência dos governantes no nosso país. Isso eu falo com toda certeza. Todo esse tempo recebemos aqui três meses de auxílio. Olha quanto tempo tem a pandemia. E o que nós recebemos foi três meses de auxílio. Daí pra cá mais nada.

Mas é muito angustiante quando a gente vive em um país que quem mais mata, quem assassina são as pessoas que são vistas pelos governantes como cidadão de bem.

Alimentação: unindo a pesca e a terra

A minha idéia de voltar prá terra é o pensamento de simplesmente cuidar da alimentação.

Nós temos aqui a pesca, nós conseguimos dela uma boa parte de alimentação, mas faltam outras coisas.

Então, a minha ideia é simples. É garantir essa questão. Garantir que eu não vou ficar sem comida.

Então estou fazendo essa agregação aí, unindo a pesca com a terra.

Só que essa é uma questão que eu viso mais naquela ideia de fazer com que outras pessoas percebam que esse é o golpe de mestre.

Porque os caras querem nos matar de fome. E se a população começar a perceber e trabalhar dessa forma, a gente vai conseguir ser bem mais resistente.

A partir dessa tranquilidade que você tem comida, você se tranquiliza e dá prá você pensar, raciocinar melhor.

Então, a minha ideia maior é essa. Fazer com que outras pessoas percebam e me acompanhem. E sigam aí prá que a gente venha a estar mais forte.

Porque é o que nos resta é a luta mesmo.

O que a gente sabe é que a gente vai precisar lutar. E lutar de barriga vazia, não tem como.


Aliados, parcerias e amigos

Não posso deixar de agradecer, e dizer que é muito significativo para as comunidades que estão em luta, a parceria que a gente tem com a AATR (Associação dos Advogados e Advogadas dos Trabalhadores Rurais).
Uma associação muito comprometida com essa luta nossa, que nunca nos deixou desamparado nas questões jurídicas.
Desde o derramamento do petróleo que a Fiocruz vem nos alertando para os riscos que estamos correndo. Sempre demonstrando muita preocupação com a nossa categoria, por sermos povos das águas e quilombolas.
Sempre nos apoiando também com projetos para alimentação, higiene. Nos proporcionou condições para a gente colocar a horta aqui. Inclusive é aquela horta que está naquela foto nesta publicação.
Também temos parceiros aqui da região. Como por exemplo a UNEB (Universidade do Estado da Bahia), da UFRB (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia), o IFBA (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia ).
E destaco aqui os nomes de Rebeca, de Erahsto, da Diretora Geni, do Diretor Geovane, todos muito presentes aqui na comunidade.
E não podemos deixar de falar também do trabalho do CPP (Conselho Pastoral dos Pescadores), em estar sempre buscando encurtar caminhos para que a gente chegar a locais que não eram de nossa habilidade. E também para fazer formação.
E muitos outros nomes, que é muita gente.
Em nosso nome e em nome de muitas outras comunidades também, a gente sabe que ajudam e ajudam muita gente. Muito obrigado.


Obs.: fotos da plantação são da horta comunitária de Graciosa.


sobre Caminhar para a Autonomia:

  • aborda casos concretos de comunidades e territórios com lutas e experiências em seu processo de conquistar autonomias;
  • um passo além dos Diários da Pandemia, até mesmo porque muito embora a pandemia prossiga é impositivo florescer territórios para além dela;
  • envolve também um diálogo com o livro “Por Terra e Território: os Caminhos da Revolução dos Povos no Brasil”, com as caminhadas que este propõe, para divulgar não só situações já existentes como aquelas que surjam a partir de sua leitura.

acesse a série completa: aqui


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