Posted on: 24 de outubro de 2019 Posted by: Teia dos Povos Comments: 2

CARTA DE APOIO ÀS COMUNIDADES TRADICIONAIS PESQUEIRAS

Os pescadores e pescadoras artesanais são homens e mulheres que produzem alimentos saudáveis e contribuem para a soberania alimentar do país, garantindo a segurança alimentar e nutricional da sociedade brasileira. Estes povos preservam as águas, as florestas, os manguezais e a cultura dos seus ancestrais. Além da importância econômica, os pescadores e pescadoras artesanais desenvolvem uma série de saberes, fazeres e sabores que representam elementos culturais de matriz indígena e afro-brasileira. Ao praticarem essa atividade milenar, as comunidades pesqueiras estabelecem uma relação bastante peculiar com os recursos naturais, o que garante a preservação dos seus territórios, bem como sua reprodução física e cultural.

Entretanto, a importância econômica, social e cultural da pesca artesanal sempre foi ignorada pelo Estado Brasileiro, que investe em políticas desenvolvimentistas que favorecem o avanço de grandes projetos econômicos em áreas historicamente utilizadas pelas comunidades tradicionais, ameaçando seu território e patrimônio cultural. Esta situação é agravada na medida em que o governo, através da pressão de empresários e latifundiários, busca flexibilizar a legislação ambiental a fim de favorecer a expansão do agro e hidronegócio, inclusive nas áreas de preservação permanente (manguezais e matas ciliares).Consequência disto são os inúmeros desastres ambientais ocorridos nestas áreas como o fenômeno da Maré Vermelha que é a proliferação de algas tóxicas por conta da contaminação da Baia de Todos os Santos, a explosão do navio Gold Miller no Porto de Aratu provocando um desastre ambiental na Baía de Todos os Santos principalmente as comunidades da Ilha de Maré e adjacências e o desastre da barragem de Mariana em Minas Gerais que gerou consequências ambientais em algumas regiões baianas.

Desde a última semana de agosto os territórios tradicionais de pesca foram violentamente atingidos por mais um gravíssimo acidente de consequências ainda incalculáveis, com um derramamento de óleo que atinge o litoral do Nordeste tendo se expandido por todas as regiões do litoral baiano, localidades utilizadas por pescadores e pescadoras das comunidades. Embora exista um Plano Nacional de Contingência, nada foi desencadeado, deixando as populações, em particular as comunidades de pescadores artesanais, assim como o meio ambiente, expostos aos impactos negativos do derramamento, como a inviabilidade da comercialização, o que aumenta a situação de pobreza imposta para os pescadores e pescadoras do nordeste e consequentemente aumenta a sua vulnerabilidade. As únicas medidas tomadas até agora se concentram na limpeza das praias e não na contenção do óleo.

É importante dizer que as águas para os pescadores e pescadoras não são somente ambiente de trabalho é também território de identidade e fé. Um território ancestral que, quando impactado, provoca não somente adoecimentos físicos, como psicológicos a aqueles e aquelas que dele faz o uso, fortalecendo a sua identidade.

A zona costeira brasileira possui vasta área de manguezal com grande importância para a reprodução das espécies, pescadores e pescadoras são responsáveis por cerca de 70% de todo o pescado produzido diariamente, ainda assim, nos últimos anos os pescadores e pescadoras vem enfrentando sistemáticos ataques aos direitos e a identidade através de medidas provisórias e decretos como: 8424/2015; 8425/2015; 8467/2015. Desde 2013 não é emitido documento de pesca – o Registro Geral da Pesca (RGP) – e os jovens estão pescando de forma ilegal e muitas das vezes são impedidos de exercer a pesca.

A Teia dos Povos manifesta sua preocupação ao tempo que repudia e exige providência de apoio aos pescadores e pescadoras e a juventude pesqueira na ação de defesa do território pesqueiro impactados pela chegada do óleo com prejuízos à saúde, ao modo de vida e as atividades de sustento desses povos. Causa indignação a falta de medidas cabíveis por parte dos órgãos competentes, em particular o descaso e o silêncio do governo federal.

Exigimos das autoridades competentes que desencadeiem imediatamente o Plano de Contingência a fim de classificar, controlar, retirar a substância e prevenir a ampliação dos danos, além de promover a ampla e verídica informação à população em geral e aos pescadores em particular, associando os pescadores artesanais às ações de contingência e monitoramento da contaminação.

Cabeceira do Rio Utinga, primavera do 519º ano da primeira invasão.

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