Posted on: 14 de fevereiro de 2021 Posted by: arkx Brasil Comments: 0

Temos que acelerar esse processo de debate político para tirar nossas dúvidas. Tirar ansiedade também, que é um problema grave. Quando estamos começando qualquer coisa nova, as pessoas ficam muito ansiosas para encontrar caminhos.

A gente está dizendo que o caminho nós vamos construir juntos, com o povo. Só o povo é capaz de construir o grande caminho. A grande revolução. Sem o povo é impossível construir o caminho.

Nós queremos fazer um caminho de dois mil anos. Mas tem coisas que dá prá fazer agora. Não podemos mais esperar. Então temos que começar urgente a fazer o nosso caminho. E o caminho se faz ao caminhar.

A ­­Teia dos Povos não tem nada de novidade. Estamos nos reconectando com nossos antepassados, com nossos ancestrais. E também queremos construir uma espiritualidade que possa dar conta dessa dificuldade nossa hoje de compreender o processo revolucionário no Brasil.

A Teia vem de Palmares, vem dos Povos Originários que guerrearam muito. Vem da Confederação dos Tamoios, Cabanagem, Ligas Camponesas, do MST. E também os movimentos urbanos, que temos uma herança urbana muito grande de lutas.

A Teia é essa busca, esse chamado, para que através de uma grande organização a gente possa construir a unidade dos Povos no Brasil. E também na América Latina, por que a luta vai ultrapassar as fronteiras.

Sem unidade não vamos fazer luta nenhuma, sem organização nós não vamos fazer luta. Precisamos construir uma grande unidade dos Povos.

É diferente do que vem acontecendo há muito tempo. Em que se continua insistindo nessas alianças de conciliação de classe. Que não querem romper com esse passado escravocrata, não querem romper com essa elite escravocrata.

Com nossos algozes não tem unidade. A nossa unidade tem que ser com os Povos em Luta.

Temos que entender que o Capitalismo só tem possibilidade para 1% da humanidade, com uns 10% de serviçais. A maioria da humanidade já está descartada.

Onde estiverem duas pessoas, três pessoas lutando, nós estamos ali. Nós somos a Teia.

Essa luta não vem de agora, é uma luta milenar. Nós entendemos que é uma Luta de Classes mas é também uma luta muito maior. A luta dos povos originários por Terra e Território vem ao longo de séculos. Os Povos lutam por Terra e Território há muitos anos.

Essa é uma luta ancestral para recuperar várias questões deixadas para trás. É uma luta que tem uma forte espiritualidade. Não na questão religiosa, mas espiritualidade dos povos que sempre se basearam nessa força para seguir lutando.

Precisamos entender isto e construir um processo de unidade que resgate essa ancestralidade, da luta dos povos. E coloque em nós o espírito dos guerreiros que já partiram, que foram para outros planos.

A sociedade brasileira é uma sociedade complexa, de vários povos, de várias identidades, de várias culturas. Então essa unidade não será uma unidade burra.

Primeiro é respeitar a diversidade dos povos. Respeitar os que chegaram primeiro, os que estão aqui há mais tempo. Os Povos Originários. Esses povos tem sabedoria e tem conhecimento. Por isto sobreviveram e estão aqui até hoje.

A diversidade dos povos que vieram da África. Muita gente pensa que o povo preto é um só. Não é um só. É uma diversidade de povos, de conhecimento e de sabedoria que vieram forçados da África para aqui.

Após a falsa libertação da Lei Áurea foram soltos aí, sem terras, sem casa, sem pão… Esses povos sobreviveram, com a força de sua espiritualidade, dos espíritos que trouxeram da África.

A Teia propõe uma radicalidade nas mudanças, nas transformações. Elas não virão pacificamente, não virão na “paz e no amor”. A luta tanto é luta rebelde dos povos como é luta de classes.

Não é na conciliação, nos acordos, nos conchavos, que vamos resolver a grande contradição histórica da humanidade aqui no Brasil. Não tem como resolver isto no diálogo, será um processo muito forte de resistência e luta.

Outra questão é entender também que esta luta não será financiada por nossos inimigos. Tem muita gente aí que acha que esta luta nossa vai ser financiada pelos donos do poder.

E agora está uma lógica que o Imperialismo financia luta para a gente fazer luta contra nós mesmos, para dividir o povo e eles continuarem mandando.

Precisamos buscar nos financiar a nós mesmos. Transformar a luta de nós para nós mesmos. Paz entre nós e guerra aos senhores.

Qual a sociedade que nós queremos? Nós temos que sonhar com ela. É utopia! Mas utopia só por utopia não vai resolver. Temos que praticar essa sociedade que queremos.

Como vamos resolver a questão do preconceito de cor? Vamos esperar a revolução? Nós temos que conversa agora! Como vamos discutir a questão das mulheres, a maioria da sociedade? Vamos esperar a revolução para fazer esta mudança? E os preconceitos em relação aos LGBT? Nós temos que fazer isto agora.

Essas coisas nós temos que construir no dia a dia. A sociedade que nos sonhamos, que nós queremos, ela tem que ser construída todos os dias. Tem que ser uma luta permanente, porque a revolução ela é permanente. Ela não é estática.

Para essa construção vamos precisar trabalhar sol a sol. Ela não dá para adiar, não dá para a gente esquecer, não dá para a gente ficar chorando todo dia os nossos mortos, reclamando porque não tem para quem reclamar, mendigando favor…

Nossa independência e nossa liberdade não é favor, é uma conquista.

A luta por Terra e Território é uma luta por poder. Os primeiros povos a perderem sua terra e seu território foram os povos originários. E foi massacre e mais massacre. Neste momento de pandemia, precisamos lembrar que contra os povos originários foram várias guerras biológicas.

É a construção do poder. Não é tomar poder. Por que tem muito gente que vem todo tempo atrás de tomar poder. E quando está lá se transforma em algoz tanto quanto a elite que está aí.

Não estamos atrás disso. Colocar um iluminado lá para assumir o poder e nos comandar. Precisamos de uma organização, de uma estrutura, onde todos nós temos poder.

Um trabalho na consciência é fundamental. Mas a consciência só transforma onde nossos pés pisam. Não adiante construir um mundo de utopia só. O mundo é de realidade, e do concreto. Então é aí que nos temos que mudar.

Como você vai mudar a relação familiar se você na sua família não se dedica a este processo? Como você vai mudar a sua comunidade se você não é uma referência, você é um mal exemplo?

Como é que você vai querer fazer a mudança no botequim? Todo dia tomando cachaça e cerveja que o Império está produzindo, e voltando para casa bêbado e lá cometendo vários delitos contra sua companheira e seus filhos.

Isso não é moralismo. É outra coisa!

Então como vamos fazer na parte organizativa?

Em todos os lugares onde estivermos temos que construir os Núcleos da Teia. E começar a fazer luta. Precisamos organizar movimentos para o enfrentamento. Isto é a organicidade da Teia.

Precisamos organizar o cuidado com nossos parceiros, com nossos vizinhos, com nossos companheiros. Porque aí começa a comunhão, a relação.

Os Núcleos tem que ter essa tarefa de cuidado, de respeito, de carinho, de tentar resolver os problemas daquela comunidade. O Núcleo é capaz de fazer essa firmeza com nós mesmos e com os outros.

 E também o trabalho para organizar os Elos. São as pessoas que estão dentro de uma instituição, dentro da Universidade, numa escola.

Precisamos em nossas comunidades ter os nossos produtos e fazer com que eles circulem para outras localidades. Como vamos fazer isto? Se tivermos os Núcleos e os Elos. Essa interligação é que é importante para nossa organização.

Precisamos criar os Elos para a defesa. Muita gente pensa que defender um território é só de estar de arma na mão. Muitas vezes você está com arma e não vai defender, porque os nossos inimigos tem mais força.

Nós temos outras armas para usar e nos defender. A comunicação é uma delas.

Temos que fortalecer a cabeça de nosso pessoal que temos que nos defender em nossos territórios. Não adianta nós ficarmos chorando, esperando que alguém vai defender a gente. Quem tem que defender o povo é o próprio povo.

É entender que só o povo salva o povo. Quanto mais gente tiver, mais seguros estamos. Não tem grupelho que vai fazer nada. Precisamos organizar o povo.

Em nossos territórios precisamos fazer aquele local ser referência. Se estamos numa favela, precisamos de uma organização para fazer aquele local bonito, ter tudo que a gente precisa ali dentro, uma economia forte, uma escola nossa.

Sem depender do Estado.

Energia renovável para termos soberania energética. Soberania hídrica. Soberania alimentar.

Se conquistamos um território com nossa luta e organização, temos que transformá-lo num paraíso. Onde todos possam se encantar com a possibilidade da mudança.

A questão da organicidade é coisa básica, é simples. A construção dos Núcleos de Base do povo que está lutando organizado. E os Elos para juntar solidariedade, informação, saber o que cada um está fazendo.

E fazer a massificação desse processo.

A Terra é poder. O Território é poder. E o Território pode nos ajudar, junto com a natureza, a nos reconstruir.

Temos que enfrentar o Capitalismo no campo. E não com Reforma Agrária, para dar um pedacinho de terra ao camponês, para se iludir com política pública.

É construindo Territórios nas terras que já reconquistamos.

E as terras que ainda não temos, nós temos que conquistar. E é na força! O Capitalismo e o agronegócio não vão entregar as terras.

Eles fizeram a guerra contra os povos originários para tomar as terras. Massacres para tomar a terra. Não podemos cair na ilusão que a retomada da terra vai ser pacífica.

Quando retomarmos nossa terra temos que construir uma comunidade verdadeiramente humana, capaz de entender a importância da natureza.

Não podemos ir para a terra para fazer o que o agronegócio faz. Louvar o boi como nosso único alimento. Fazer monocultura. Não podemos ir para a terra com cabeça de fazendeiro, com cabeça de latifundiário.

Temos que ir com a cabeça da agroecologia.

E criar uma solidariedade muito grande com as pessoas da cidade, para reorganizarmos os territórios devastados pelo agronegócio e pelo Capitalismo. Porque isso não é só papel das pessoas que voltam para a terra. É papel de toda sociedade.

Tem um grupo grande, inclusive na Esquerda, que acha que a luta pela terra no séc. XXI perdeu o sentido. Mas estamos vendo aí como os grandes capitalistas estão comprando terra.

A Terra e o Território estão na ordem do dia.

E no campo isto é também o enfrentamento à propriedade privada. E nisto se inclui a propriedade da água, dos minérios, dos meios da natureza.

Não dá mais para ficar nessa ilusão de criar camponês. Precisamos assumir a luta pela Terra e Território para construirmos verdadeiras comunidades para além do Capital.

vídeo:

Joelson Ferreira
Assentado no Terra Vista, no sul da Bahia, com 30 anos de luta pela terra, já foi da Direção Nacional do MST, Mestre na Agroecologia, um dos fundadores da Teia dos Povos em 2012.


Mais sobre a Formação Política: aqui


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