Posted on: 30 de setembro de 2023 Posted by: Teia dos Povos de Pernambuco Comments: 0

No dia 19 de agosto, uma caravana da Teia dos Povos em Pernambuco pegou a estrada rumo à Várzea do Una, comunidade pesqueira situada no Litoral Sul do estado. Em dois dias de ação coletiva, moradoras do território, núcleos de base e elos da Teia vindos das diversas regiões do estado teceram escutas e vozes que contribuíram para fortalecer os fios de lutas pelo bem viver da gente que constrói sua vida nos lugares banhados pelo Rio Una.

No primeiro dia de encontro, pela manhã, a caravana caminhou pela comunidade ribeirinha, dialogando com lideranças e moradores locais. À tarde, promoveu um círculo de diálogo com a população moradora das margens do Rio Una, do qual participaram pescadores, marisqueiras e artesãos nativos. O momento teve o intuito de conversar sobre o contexto e as demandas locais referentes às cheias que vêm assolando a região. Além disso, construir coletivamente possíveis ações de mitigação para as recorrentes enchentes ocasionadas pelo assoreamento na região de desembocadura do rio. 

Na manhã do segundo dia de ação, a caravana, da qual participaram estudantes do curso de Oceanografia da Universidade Federal de Pernambuco, percorreu áreas referentes à foz do rio e manguezal, utilizadas para a pesca artesanal. Moradores apontaram a mudança na intensidade das cheias do Rio Una no contexto de transformações ambientais. Entre elas, a formação de bancos de areia que estreitam a vazão do rio e o aumento da intensidade da deposição de sedimentos após dragagens em porções internas, referentes aos municípios vizinhos de Palmares e Barreiros.   

Essa situação vem acarretando cheias de grandes proporções que refletem em graves danos materiais e imateriais. O impacto é expressivo para a atividade de pesca tradicional. Também existe uma erosão cultural grave que vem com esses efeitos, destacando-se a dificuldade na continuidade dos trabalhos do estaleiro naval mantido por carpinteiros artesanais nativos da comunidade. Com a dificuldade de navegabilidade na Várzea do Una, muitos dos barcos, barcaças e demais embarcações têm dificuldades de atracar próximo ao estaleiro e dali serem lançados ao mar. Isso complica muito a população e os mestres que vivem desse trabalho. Nesse contexto, a falta de ações concretas dos políticos, que só tomam medidas paliativas já conhecidas quando a força das águas já tem inundado mais uma vez a Várzea, torna repetitivo o prejuízo para a vida de quem habita a comunidade. 

Propostas de ações foram tecidas a partir da confluência de vozes no encontro. Constatamos que as mudanças que atualmente atingem Várzea do Una e comunidades da região trazem a necessidade de fazer estudos a respeito dos impactos causados à fauna, flora e população, também por meio do desenvolvimento de um instrumento de monitoramento coletivo pelos moradores para medir esses danos; elaborar uma cartografia crítica do rio e do território; construir alianças com comunidades ribeirinhas e camponesas que vivem ao longo do rio para ações integradas contra empreendimentos imobiliários, mineração de areia, barramentos, e demais mega-obras que afetem e tragam prejuízos pra quem vive e trabalha em conjunto com o Rio Una; chamar o poder público para a ação, por exemplo, na realização de estudos de impacto ambiental e dragagem.

Nosso encontro permitiu ver e entender melhor as lutas que aqueles territórios vêm passando, pois não somente a Várzea do Una é atingida por todos esses impactos. São José da Coroa Grande, outro território aliado próximo, sofre diretamente com todos esses danos que as águas vem fazendo. Isso ocorre devido às mudanças climáticas drásticas causadas pelo colono capitalismo e são ampliadas diretamente, nessa região, por invasões individuais ao direito coletivo da natureza. O bioma local vem sentindo essas mudanças, com o mangue sendo sufocado pelo acúmulo de areia, o que dificulta sua sobrevivência e a de todo ecossistema e comunidades cujo modo de vida tradicional é baseado nessa convivência.

Temos ainda muito a enfrentar. Existe uma insistente violência agindo para tomar nossos territórios e destruir nossas histórias, tradições e vivências. Com esse intento, atingem diretamente nossos biomas, que são parte inseparável dos nossos modos de vida, em prol de um “desenvolvimento” que só serve ao capital e aos indivíduos que participam dos seus lucros). 

Estar juntos nos fez enxergar nossa força. Estreitar os laços. Nossa voz e nossa vontade se tornam mais fortes coletivamente. Continuamos em luta para manter nossas histórias vivas! É por isso que nos alinhamos em Teia, como as redes da pesca tradicional que sustentam a sabedoria coletiva das nossas comunidades. Nossa união é um encontro de águas que irá desaguar em um oceano onde coexistem infinitas correntezas!

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